segunda-feira, 4 de julho de 2011

Meia noite

      No dia seguinte, ele estava morto. Parecia esperar eternamente por um futuro que jamais viria. Era uma pessoa a quem sabíamos ser boa, tinha ainda muito por viver. Agora estava ali, imóvel, apenas mais uma vítima daqueles estranhos eventos mensais. O povo até já se habituara, mas não havia como aceitar tais desgraças com um sorriso nos lábios. Cada morte era uma dor, cada mês representava a angústia de atravessar os dias sem saber quem seria a próxima vítima. Seria um amigo, um tio, um primo, um irmão, uma mãe, um pai, ou você mesmo? Impossível saber.
      Desde que eu era pequena, há tempos atrás, me pai dizia que à meia noite da primeira sexta- feira do mês aparecia uma visagem pelas ruas maranguapenses, acompanhada de um terrível barulho de correntes sendo arrastada e gritos agonizantes. Contava que via-se o fantasma do filho que matou o pai, arrastando o cadáver acorrentado pelas estradas da cidade, algo sobrenatural que até então eu nunca havia presenciado.
       Àquela semana, lembro-me bem, tinha completado meus dez anos de idade, e passara os dias ainda na euforia dos presentes ganhos e às lembranças do delicioso bolo de chocolate que mamãe preparara para colocar minhas dez velinhas. E era sexta-feira, a primeira do mês. Estávamos sentados na calçada em frente à minha casa, e conversando, não vimos o tempo passar. Então começamos a ouvir um som estranho, um assovio bem fino, seguido de um barulho de como se alguém estivesse arrastando um punhado de correntes pelo chão.”Pai, o que é isso?”, eu perguntei. E ficou todo mundo assombrado. Papai, depressa, nos falou: “Entra todo mundo que isso é o filho que matou o pai. Ele anda arrastando o morto pelas ruas do Maranguape, e pode ter certeza que amanhã alguém aparece morto na cidade”.
        Foi a última vez que ele nos contou aquela história. No dia seguinte, não acordou novamente. Tinha simplesmente parado de respirar.



* Esse texto é baseado no conto popular maranguapense conhecido como " O filho que matou o pai" ou " O grito da meia noite". Mas quem conta um conto, sempre aumenta um ponto, né? 
Fiz esse texto pra um trabalho de história do colégio, muito interessante por sinal. Ouvi o relato da dona Lourdes ( tenho gravado ainda aqui no pc) e me inspirei pra escrever. Espero que dê medo rsrsrsrs...