sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Por dentro

Ter dimensão da enormidade das próprias entranhas
Somos imensas
Dentro de nós cabe tanto

É no oco e no vazio que moram nossas maiores potências
É no espaço que abrimos em nós que mora o prazer
É em se abrir a flor de carne 

Na troca
No afastar das pernas para o abraço do mundo

Em me abrir é que mais me tenho


*

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Aérea

Como Carlota, estou enraizada bem no meio desta terra.
Me imagino transmutando-me em outra: raízes-escora, aérea, caminhando pela vida.
Meu ascendente de elemento terra me pergunta se o que eu criei sob meus galhos ficaria bem.
Se sobreviveria. 

Todo um ecossistema. 
Amores grandes e pequenos, amigos. 
Flores cultivadas e flores espontâneas, todas belas.
Passarinhos, borboletas, besouros.
Minhas folhas que por anos tem protegido este chão.

Enquanto minhas raízes estão aqui sob a terra, quentinhas e úmidas, me pergunto se dói tocar o ar. 
Se este vento ressecaria minhas entranhas a partir da pele.
Quanto tempo eu duraria.

Às vezes eu e Carlota somos uma só, expandindo infinitas nossas raízes. 
Nos movemos pelo fogo que nos habita.
Aparentemente imóveis, mas em expansão. Percorrendo a terra desesperadas por um pouco de água e ar. Plenas de fogo e lenha, mas sem oxigênio.
Como arderemos, Carlota? 
Quando nossas labaredas serão vistas do céu?

Para despistar nossa expansão, eu e Carlota podamos nossos próprios galhos - temos agora esta copa discreta. Dizem que podando a copa, as raízes esbarram de crescer, de se ir pra tão longe.
Carlota é uma Ficus - por sua natureza tem raízes que a fariam rebrotar à metros de distância de onde está plantada.
Se me cortarem, será que rebroto fora daqui? À muitos metros distante? 
Minha natureza será de rebrotar?

Aos pés de Carlota esqueço que tenho pernas.
Gente tem pernas. E caminha.
Tem raízes de ir e vir.


*