domingo, 18 de março de 2012

Fotografia do caos

   Olho ao meu redor, gargalho, escrevo: o caos é tão... criativo!
   Mais uma bolinha de papel corta o ar em minha direção e eu me desvio naturalmente: já estou tão craque nisso que sequer preciso de esforço mental pra coordenar o movimento! Do meu lado, uma garota joga ferozmente os cabelos à frente para em seguida amarrar os fios no alto da cabeça: seus cabelos eram agora um negro chafariz jorrando pra cima, ridiculamente cômico, impossível não chorar de rir!  Outro cidadão aqui do lado está cantando o mais novo sucesso do Michel Teló num mix das versões em espanhol, inglês e sei lá mais o quê, gritando “ai, se yo te pego” numa placidez facial de quem canta Garota de Ipanema! E eu? Bom, eu solto mais uma gargalhada, e só. E escrevo, é claro. E o cidadão não entendeu o motivo da minha risada.
   Fazem 30 minutos que a professora de português chegou. E é claro que ela ainda não iniciou a aula. Está num infindável dilema sobre quem entregou ou não os trabalhos parciais, parece que alguns deles sumiram. Aí alguém grita que levaram os trabalhos pro banheiro e disponibilizaram para “uso higiênico”. Aí gargalho outra vez. E escrevo, é claro. Fossem outros tempos eu até ralharia com a idiotice da frase. Mas, hoje não.
   Hoje o ar é tão leve que até o caos ao meu redor é a mais bela obra de arte. O burburinho, os gritos de adolescentes à flor da pele, as batucadas que de vez em quando cismam fazer... tudo isso soa tão harmônico aos meus ouvidos que este meio sorriso insiste em não me sair do rosto. E pra completar a sinfonia, o pessoal do fundão começou a imitar o coaxar de sapos. Sinto-me em um brejo. Aí, gargalho outra vez. E pareço uma louca rindo sozinha.

É que, fossem outros tempos, estaria enfezada. Mas, hoje não. Hoje estou em paz.

Na verdade, hoje SOU em paz.

E a fotografia do caos me é à óleo de Picasso.   

Madrugada

E a chuva deitada
Caía em pé
E dessa madrugada
Seja o que Deus quizer

Se sobreviverei?
Isso eu sei que não sei
A profunda emoção
Vai além da razão!

De insônia não durmo
Em pensar no amanhã
Nasça pois, logo, o sol
Com todo o seu afã

Ilumine minhas ruas, minhas vida,
Meu campo, meu trampo
E que brilhe acima de você:
Que ilumine teus olhos,
Que me fazem viver!

terça-feira, 13 de março de 2012

Imperfeição

Era só...
uma coisinha boa transbordando-lhe o peito,
Uma estrela a mais no firmamento,
A canção preferida que não parava de tocar...

Nos rios de chuva a tremular o telhado,
No cheiro macio de abraço apertado,
Nas cores da rua sob o luar...

Ah! Finalmente sentia!
É que, de fato, descobrira algo que pouquíssimos mortais puderam descobrir. Fora incrivelmente privilegiada, e agora não conseguia desfazer o riso!
Não, não. Não eram gargalhadas. Era só... aquele tipo de sorriso que nasce entre as vísceras, sabe? Que lhe revirava o estômago e que acabava por relaxar-lhe inevitavelmente os músculos da face, que acabavam por deixar-se levar praquele sorrisinho que, por um segundo, lhe fazia a mulher mais linda do mundo.

Ah! Suas células gritavam. AH! Cada mililitro de sangue parecia estar plenamente consciente de sua nova consciência: o líquido vital fervia nas veias transformando-lhe a pele alva em carmim!

Ah!
O aroma denso de um café fresquinho,
O ventinho gelado pós-chuva na pele,
O sorriso de amigo,
A brisa de mar!

Hummm, descobrira! E era a sensação mais deliciante que já experimentara. E que experimentaria novamente toda vez que lembrasse que já experimentara.                                                        
Descobrira. Agora parecia tão óbvio! Mas, descobrira! E fora tão incrivelmente privilegiada que agora não conseguia desfazer o riso!
Não gargalhava, mas suas células gritavam. E ria aquele riso que vinha das tripas.                                   

Descobrira algo que pouquíssimos mortais puderam descobrir.

É que a perfeição que por anos buscara, e, por cansaço já cria não existir agora estava lá, debaixo de seu nariz.
E encontrara-a exatamente e absurdamente nas coisas que um dia julgara imperfeitas.