domingo, 29 de março de 2020

Pouso

Nada mais leve há que uma libélula pousada no céu azul.
Asas imóveis e transparentes, sustentando a beleza fugaz de uma vida breve, de um ciclo em que não há espaços para apegos maiores que o corpo em que se habita.
Equilíbrio de quem é frágil, mas que por isso mesmo levita.

A minha libélula deixou-se ver por dois minutos quase inteiros.
Tudo o que ela pôde me dar foi aquela beleza que me atravessou.
Quis tirar dela uma fotografia, fazê-la ficar fixada aqui ainda mais um pouco...
Por querer capturá-la, a perdi.

Minha libélula partiu.


*

Limbo

Que será de nós?
Animais que constroem em pedra selvagem um abrigo da força das próprias mãos
Imbecis a repicar a Terra, aumentando a distância entre irmãos
Ilegais mastigando aço e aspirando ouro como fossem ar e pão

Que será dos nós?
Amarrados em nossas agendas arrastando grilhões
Imbricados em vários nadas que valem milhões
Irritados com a correria e o medo do não

Que seremos nós
Quando o tempo parar e a luz acabar e o medo bater
Se silêncio assombrar e vier devorar você
E o futuro com suas quimeras não acontecer?

Que será de nós?
Que será dos nós :
Que Ser?


*

quarta-feira, 4 de março de 2020

Poema do meio dia

m e l a n c o l i a
o mel que nutre a magia
a mão que estanca a alegria
o espaço entre a cor e a agonia

m e l a n c o l i a
é tudo que anda lento
um mergulho fundo no momento
o portão pra escapar do desalento

m e l a n c o l i a
uma parada no meio do dia
pra entender porque tudo corria
enxergar algo que não se via

m e l a n c o l i a
da vida uma lente de aumento
o silêncio depois do tormento
mastigar e engolir pensamento

*